CHRISTCHURCH, NOVA ZELÂNDIA

A passada sexta-feira foi marcada pela infâmia do terror. Quis o destino que no mesmo dia em que em aula do nosso curso do 1.º ano reflectíamos sobre o registo documental da morte e em que, também em Lisboa, subia ao palco “Requiem para L.”, no qual observa-se o filme de alguém que morre, acontecesse um inédito homicídio em massa captado em vídeo, quando em Christchurch na Nova Zelândia um homem sem disfarce filmou-se em directo numa espécie de câmara subjectiva a executar com armas adquiridas legalmente dezenas de pessoas, como figuras de um jogo de vídeo, comentando os seus actos, premeditados com minúcia, levando para um outro nível a captação audiovisual da morte e a sua espectacularização.

“Requiem para L.”, obra musical e cenográfica de Fabrizio Cassol e Alain Platel, que esteve na Culturgest, integra o vídeo do falecimento de uma mulher por causas naturais, com o consentimento prévio da própria. É um exercício que convoca para o interior de um espectáculo a morte e faz-nos pensar sobre os seus rituais religiosos e sobre ela própria, numa celebração da vida no palco pelos intérpretes, na sua maioria de raça negra.

Nos antípodas morais, conceptuais e geográficos deste Réquiem, no mesmo dia realizou-se (verbo aqui também no sentido técnico) um “snuff movie” copiosamente partilhado nas redes sociais, sobre o qual interessa reflectir. Ficam aqui duas ligações com esse intuito.

 

Artigo da Foreign Policy, revista fundada pelo cientista político Samuel P. Huntington, famoso pela teoria do choque de civilizações, assente na ideia que no mundo pós-Guerra Fria seriam tensões culturais, e não ideológicas, a originar os grandes conflitos.

http://foreignpolicy.com/2019/03/15/how-the-christchurch-shooter-played-the-worlds-media

 

Publicação da PRI, estação de rádio pública norte-americana, com a visão da tecno-socióloga turca Zeynep Tüfekçi.

www.pri.org/stories/2019-03-15/new-zealand-shooting-video-was-made-make-us-watch-it-professor-says-dont

 

Foto: Brenton Tarrant, o suspeito dos atentados nas duas mesquitas na Nova Zelândia em tribunal, com rosto digitalmente ocultado.